Pedro sentara-se na paragem do
autocarro, arfava, procurava recuperar o fôlego que perdera no
caminho. Correra demasiado rápido, o seu corpo não aguentava. Tivera de parar. E, agora que parara, via os autocarros
a passar e as pessoas a entrarem e a saírem deles, paralisara por completo.
Além de se sentir incapaz de se
mexer, apercebeu-se que não conseguia recuperar o ritmo normal da respiração.
Pelo contrário. Cada pessoa que entrava no autocarro, aquele autocarro que era
suposto ser o sentiu, ficava ainda com mais falta de ar. Estava a sentir que ia
perder os sentidos, percebia que ficara pálido, que as suas mãos tremiam sem
parar e que o seu pé direito batia continuadamente no chão.
Era como se aquela corrida,
aquela paragem repentina e aquelas pessoas correspondessem a uma metáfora da
sua vida. Tinha corrido a vida toda, à procura de novas
oportunidades, à procura daquela felicidade que lhe parecia escapar sempre e,
quando achava que o tempo já não o incomodava, que já estava sereno com as suas
decisões, lá vinha alguma coisa, algum evento, que o obrigava a parar, a ver o
que se passava à sua volta, e, nesse momento, era-lhe roubada a essa limitada
calma…
A única coisa que ouvia
era o “tic, tac, tic, tac” do seu relógio.
“ tic- tac, tic, tac”,
“tic, tac, tic, tac”
Cada vez que ouvia este som
repetitivo e monótono, penava, “o tempo passa por nós e nos não damos conta”…“tic- tac, tic, tac”, “tic, tac, tic, tac”, incessante.
E mais uma pensamento aterrador: “não recuperamos o tempo perdido.”
“tic- tac, tic, tac”, “tic, tac, tic, tac”, “tic- tac, tic, tac”, “tic, tac, tic, tac”, “raios, este relógio não me dá tréguas”, exclamou sem se dar conta, enquanto tentava controlar as lágrimas que ameaçavam sair descontroladamente.
Não se apercebeu que um velho estava sentado ao seu lado. Tinha-se esquecido de onde estava, enquanto se concentrava na sua respiração e procurava combater o medo que o invadira.
O velho, esse, transparecia calma e serenidade. Aquela calma e serenidade que só a idade nos dá, tão contrastante com a angústia óbvia que reflectia o rosto de Pedro, com pouco mais de 30 anos.
O velho, perante aquela exclamação, perguntou-lhe, colocando-lhe a mão no ombro, “o que se passa?”, “posso ajuda-lo”
Pedro, perante aquele acto de singela humanidade, chorou sem parar, deixou que a angústia se apoderar-se completamente de si e balbuciou “não sei o que fazer… há tanto que devia ter feito e não fiz, tantas oportunidades que não agarrei, tanta coisa que não aprendi…”, e à medida que recuperava algum controlo sobre o choro, continuou “Tenho medo. Tenho medo de nunca chegar a tempo e de não alcançar os meus sonhos.”… “tenho medo”, repetiu.
O velho sorriu. “Compreendo”, disse. “Todos passamos por isso, ao longo de toda a vida, de forma mais ou menos intensa”, acrescentou. “A verdade é, no entanto, que só no dia em que pararmos de respirar é que deixamos de ter tempo, não é? Até lá, há sempre uma hipótese de se tomar outro caminho ou concretizar um sonho, não acha? “, perguntou.
Pedro, limpou as lágrimas, e, resoluto, respondeu “tem razão”. Mas, quando lhe ia estender a mão, em agradecimento, percebeu que o velho, naqueles segundos, fechara os olhos e adormecera.
Pedro, não quis incomodar. Agradeceu baixinho, levantou-se e apanhou o autocarro que passou logo de seguida. Assim que entrou pensou “tal como apanhei este autocarro, também aproveitarei a próxima oportunidade para ser feliz”. E mais uma vez, desta vez para si mesmo, agradeceu àquele estranho que o arrancara do momento de terror.