Este ano foi ano de visitas. Não diferente dos outros, mas
com visitas que não vieram em trabalho, ou apenas em trabalho. Tive duas
visitas em particular que despoletaram este texto. Amigas que, num salto de
coragem, estão a viajar pelo mundo, tendo-se libertado das amarras que
tradicionalmente nos agarram aos sítios.
Dessas visitas, dos passeios que construi para as dar a
conhecer a Macau menos visível - aquela que o turista não percorre com tanta
facilidade e mesmo quem cá vive nem sempre se dá ao trabalho de conhecer -, das
perguntas que me fizeram, das conversas que entabulámos, não poucas vezes pela
noite a dentro, ficou esta inexplicável vontade de começar (bem, recomeçar) a
escrever mais sobre esta terra. Tenho vivido a cidade através da lente das
máquinas fotográficas que adoptei. Tenho evitado a escrita, porque não me corre
facilmente a pena quando se trata de Macau. Diferentemente, o clicar da máquina
tem sido um acto orgânico, quase sempre uma espécie de imperativo. Porque a
cidade muda todos os dias e não quero deixar de registar o que hoje existe e
amanha já desapareceu; porque a identidade de cada metro na horizontal se
modifica a cada metro que se instala na vertical; porque no brilhantismo de
tanta luz de casinos há uma penumbra que quero insistentemente capturar.
E dito isto, numa evidente contradição, sinto a cidade como uma
cidade de constantes retornos, de ciclos que se iniciam, para serem encerrados
e imediatamente reabertos; testemunho-a como uma urbe que, na sua permanente reinvenção,
subsiste inexplicavelmente imutável. Basta calcorrear as ruas ligeiramente
afastadas dos seus casinos, mais ou menos novos, mais ou menos novíssimos ou ainda
por construir, e desemboca-se na Macau de há anos atrás, ainda distante da actual
loucura do bacarat, do poker e demais variantes de jogos de cartas, das roletas
em constante movimento, das slot machines em extenuante utilização.
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